Do próprio progresso

Enviado por Estante Virtual em dom, 02/12/2012 - 03:44

P: A elevação moral é, portanto, o objetivo principal da Sociedade?

T: Sem dúvida. Quem aspira ser um verdadeiro teósofo deve viver assim.

 

P: Se assim é, conforme sua observação anterior, a conduta de alguns membros está em oposição com esse princípio fundamental.

T: É claro. Mas não se pode evitar. Acontece também entre os que se dizem cristãos e procedem como se fossem inimigos de Cristo. A culpa não provém de nossos estatutos e regulamentos, mas da natureza humana. Mesmo nos ramos exotéricos públicos, os membros se comprometem em nome de seu "Eu Superior", a levar a vida prescrita pela Teosofia. Têm que conseguir que seu "Eu Divino" seja o guia de todo ato e pensamento, a cada dia e em cada momento de suas vidas. Um verdadeiro teósofo deve "se conduzir com justiça e caminhar humildemente".

 

P: O que se entende por isso?

T: Deve, simplesmente, esquecer-se de si mesmo pelos demais. Um membro da S.T. - - um verdadeiro Filaleteu - - expressou-se admiravelmente em The Theosophist: "O que cada homem necessita, antes de mais nada, é estudar-se a si mesmo e fazer um honrado inventário de seu domínio subjetivo, e por pior que este seja, acontecerá a redenção, se se propõe a alcançá-la com resolução verdadeira". Mas quantos o fazem? Todos estão dispostos a trabalhar por seu próprio desenvolvimento e progresso; muito poucos pelo desenvolvimento e progresso dos outros. O mesmo autor disse ainda: "Os homens foram demasiadamente enganados e frustrados; têm que destruir seus ídolos: deixar-se de ficções e de trabalhar para eles (e aqui se está dizendo algo de mais ou de menos, porque o que trabalha para si mesmo, melhor seria não fazer nada); que, ao contrário, trabalhe para os demais, para todos. Para cada flor de amor e caridade que plantar no jardim de seu vizinho, desaparecerá uma erva má do seu, e desta maneira a humanidade -- este jardim dos deuses — poderá florescer. Em todas as Bíblias, em todas as religiões, encontramos este conceito claramente exposto; mas homens de má-fé primeiro o desnaturalizaram e depois o corromperam e materializaram. Não é preciso uma nova revelação. Que cada homem seja para si mesmo uma revelação; que o espírito imortal do homem tome posse do templo de seu corpo; que expulse dele mesmo os mercadores e demais impurezas, e sua própria humanidade divina o redimirá, porque quando estiver unido consigo mesmo conhecerá o "Arquiteto do Templo".

 

P:  Confesso que considero isto puro altruísmo.

T: E é. Se apenas um membro entre dez o praticasse, nossa Sociedade seria, sem dúvida, um corpo de eleitos. Mas entre os que não fazem parte da Sociedade, há os que não verão jamais a diferença essencial que existe entre a Teosofia e a Sociedade Teosófica; entre a idéia e sua representação imperfeita. Essas pessoas fazem recair cada falta ou cada imperfeição do veículo (o corpo humano) sobre o espírito puro que precipita nele sua luz divina. Isto é justo? Atacam uma associação que luta pela propagação de seus ideais contra forças opostas tremendas. Alguns desacreditam e caluniam a Sociedade Teosófica só porque ela se atreve a tentar conseguir o que outros sistemas (a Igreja e o Estado cristão principalmente) não puderam alcançar, tendo fracassado por completo em seu intento; outros, porque quiseram conservar o estado de coisas existente: fariseus e saduceus no lugar de Moisés, e publicanos e pecadores gozando e desfrutando nos altos postos, como sob o Império Romano durante sua decadência. As pessoas de julgamento reto e sadio deveriam ao menos levar em conta que o homem que faz tudo quanto pode, faz tanto quanto aquele que mais tem conseguido, neste mundo de possibilidades relativas. Isto é um axioma para os crentes nos Evangelhos, explicado na parábola dos talentos entregues pelo amo: o servidor que dobrou seus dois talentos foi recompensado da mesma forma que seu companheiro que havia recebido cinco. A cada um é dado "segundo sua capacidade" .

 

P: Neste caso, é difícil fixar uma linha de demarcação entre o abstrato e o concreto, pois só temos este último para formar uma opinião.

T: Por que então fazer uma exceção quando se trata da Sociedade Teosófica? A justiça, e mesmo a caridade, deve começar na própria casa. Deve-se atacar o "Sermão da Montanha" ou fazer burla dele, porque as leis sociais, políticas e até religiosas não somente não conseguiram pôr em prática até agora seus preceitos, nem em seu espírito, nem sequer em sua letra morta? Suprima-se o juramento nos tribunais, parlamentos, exércitos e em toda parte, e faça-se o que praticam os quakers, se querem, chamar-se cristãos. Suprimam-se mesmo os tribunais, pois seguindo os mandamentos de Cristo haverão de dar abrigo a quem os despojou e apresentar a face esquerda aos que esbofetearam a direita. "Não vos rebeleis contra o mal, amai a vossos inimigos, bendizei aos que vos façam sofrer, façais o bem àqueles que vos odeiam", pois "o que infringir um mínimo desses mandamentos e assim ensinar a fazer aos homens, será chamado o último no Reino dos Céus", e "o que chama louco a seu irmão, estará no perigo do fogo infernal". Não julgue nada se não quer ser julgado. Insistir que entre a Teosofia e a Sociedade Teosófica não existe diferença, é expor o sistema cristão e sua essência a iguais acusações mas em uma forma mais grave.

 

P: Por que mais grave?

T: Porque enquanto os dirigentes do movimento teosófico - reconhecendo plenamente suas deficiências — fazem o quanto podem para corrigi-las e arrancar o mal que existe na Sociedade; enquanto seus regulamentos e leis próprios estão baseados no espírito teosófico, os legisladores e Igrejas das nações ditas cristãs fazem o contrário. Até os piores entre nossos membros não são piores que o cristão comum. Além disso, se os teósofos ocidentais têm tanta dificuldade em levar uma vida verdadeiramente teosófica, é porque são filhos de sua geração. Todos eram cristãos, educados na sofisticação de sua Igreja, de seus costumes sociais e até de suas leis paradoxais. Assim eram antes os teósofos, ou melhor dizendo membros da Sociedade com esse nome, já que nunca repetiremos o bastante, que existe uma importantíssima diferença entre o ideal abstrato e seu veículo.

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