A origem comum do homem

Enviado por Estante Virtual em dom, 02/12/2012 - 03:42

P: Como?

T: Demonstrando simplesmente, no terreno lógico, filosófico, metafísico e até científico, que: a) Todos os homens têm a mesma origem espiritual e física: o que constitui a doutrina fundamental da Teosofia. b) Que tendo a humanidade uma mesma e única essência, e sendo essa essência una - infinita, incriada e eterna, chamemos Deus ou natureza - nada, portanto, pode afetar uma nação ou a um homem, sem afetar a todas as demais nações e a todos os outros homens. Isto é tão certo e óbvio como uma pedra atirada a um lago porá em movimento — mais cedo ou mais tarde -- cada gota de água ali contida.

 

P: Mas esta não é uma doutrina de Cristo e sim uma noção panteísta.

T: Engano seu: é puramente cristã, se bem que não judaica, e talvez por isso as nações bíblicas preferem ignorá-la.

 

P: Esta é uma acusação injusta. Onde estão as provas?

T: Estão à mão. Se atribuem a Cristo estas palavras: "Amai-vos uns aos outros" e "Amai a vossos inimigos, pois se amais só àqueles que vos amam, que mérito tereis? Acaso os publicanos[1] não o fazem? E se apenas saudais a vossos irmãos, que mais fazeis que os outros? Não o fazem acaso os próprios publicanos?" Estas são as palavras de Cristo. Mas o Gênesis, IX, 25, diz: "Maldito seja Canaã; servo dos servos seja aos seus irmãos". E a gente cristã mas bíblica prefere a lei de Moisés à lei amorosa de Cristo. Apoiam no Antigo Testamento — que se presta a todas as paixões -- suas leis de conquista, anexação e tirania, com relação às raças que chamam inferiores. Só a História pode nos dar uma idéia, mesmo imperfeita, dos crimes cometidos com o apoio desta passagem infernal do Gênesis (tomado ao pé da letra)[2] .

 

P: Foi dito que a identidade de nossa origem física está provada pela ciência, e a de nossa origem espiritual pela religião da Sabedoria. Mas, sem dúvida, os darwinistas não dão provas de afeição fraternal muito grande.

T: Precisamente. Isto é o que demonstra a deficiência dos sistemas materialistas, e prova que nós — os teósofos — temos razão. A identidade de nossa origem física não alcança nem estimula nossos sentimentos mais elevados e profundos. Privada de sua alma e espírito, ou de sua essência divina, a matéria não pode falar ao coração humano. Mas uma vez provada e gravada profundamente em nossos corações, a identidade da alma e do espírito do homem real, imortal, conforme nos ensina a Teosofia, isto nos levará muito longe no caminho da verdadeira caridade e bons desejos fraternais.

 

P: Mas como a Teosofia explica a origem comum do homem?

T: Ensinando que a raiz de toda a natureza — objetiva e subjetiva — e tudo no universo — visível e invisível — é, era e será sempre uma essência absoluta de onde tudo vem e para onde tudo volta. Esta é a filosofia ariana, representada totalmente só pelos vedantinos e buddhistas. Com esta finalidade, é dever de todo teósofo incrementar por todos os meios práticos e em todos os países a difusão da educação anti-sectária.

 

P: Além disso, que recomendam os estatutos da Sociedade a seus membros? Refiro-me ao plano físico.

T: A organização da Sociedade conforme foi descrita por Eduardo Bellamy na sua magnífica obra Looking Backwards (Olhando Para Trás), representa admiravelmente a idéia teosófica, mostrando que deveria ser o primeiro grande passo até a completa realização da fraternidade universal. O estado de coisas que descreve só não alcança a perfeição porque ainda existe o egoísmo no coração dos homens. Mas, em geral, o egoísmo e o individualismo foram dominados pelo sentimento de solidariedade e fraternidade mútuos; e o plano de vida descrito na obra reduz a um mínimo as causas que tendem a criar e alimentar o egoísmo.

 

P: Deste modo, todo teósofo deve tomar parte em qualquer esforço que tenda à realização de semelhante ideal?

T: Certamente, e o temos provado com fatos. Você não ouviu falar dos clubes e do partido nacionalista que surgiram na América depois da publicação do livro de Bellamy? Vão ganhando terreno cada dia e com o tempo irão ganhando muito mais. Esses clubes e esse partido foram criados no princípio por teósofos. Um dos primeiros, o Clube Nacionalista de Boston (Massachusetts), tem teósofos como presidente, secretário e a maioria do conselho executivo. Na constituição de todos os clubes e na do partido, a influência teosófica e da Sociedade é franca e aberta, porque ai base e o princípio fundamental é o da fraternidade humana, tal como a ensina a Teosofia. Na sua Declaração de Princípios dizem: "O princípio da fraternidade é uma das verdades eternas que dirigem o progresso do mundo por caminhos que distinguem a natureza humana da natureza irracional". O que é mais teosófico do que isto? Mas não basta: é necessário também imprimir nos homens a idéia de que se a origem da humanidade é una, deve então haver igualmente uma verdade comum em todas as diferentes religiões -- exceto na judia, uma vez que nem na Cabala se encontra expressada.

 

P: Isto se refere à origem comum das religiões. Mas como se pode aplicar a fraternidade prática no plano físico?

T: Primeiro, porque o que é verdade no plano metafísico, necessariamente o será no plano físico. Em segundo lugar, porque não existe causa mais poderosa de ódio e disputas do que as diferenças religiosas. Quando uma parte da humanidade se julga única possuidora da verdade absoluta, é natural que considere seu vizinho perdido em erro ou em poder do diabo. Mas, conseguir demonstrar a um homem que ninguém possui toda a verdade, senão que se completam mutuamente, que a verdade completa só pode ser encontrada na união das diversas opiniões, depois da eliminação do falso de cada uma delas, só então a verdadeira fraternidade, em religião, poderá ser um fato. A mesma coisa pode ser aplicada no mundo físico.

 

P: Por favor, desenvolva mais sua idéia.

T: Um exemplo: uma planta é composta de raiz, tronco, galhos e folhas. Do mesmo modo a humanidade — como um todo — é o tronco que procede da raiz espiritual; o tronco é a unidade da planta. Atacado o tronco, é evidente que cada galho e cada folha serão afetados. Assim sucede com a humanidade.

 

P: É verdade; mas, ao mesmo tempo, se apenas se ataca uma folha ou um ramo, não se maltrata a planta inteira.

T: De forma que você acredita que prejudicando a um homem não prejudica a humanidade? Você ignora que até a ciência materialista ensina que qualquer prejuízo, por ligeiro que seja, causado a uma planta, vai afetá-la completamente em seu desenvolvimento? Você está errado e a analogia é perfeita. Leve em conta que um simples corte no dedo pode melindrar todo o corpo e influir no sistema nervoso; e não esqueça que pode haver outras leis espirituais que operam sobre as plantas e os animais, assim como sobre a humanidade.

 

P: Que leis são essas?

T: Nós a chamamos de leis kármicas; mas para compreender o significado completo deste termo é preciso estudar Ocultismo. Meu argumento não se apoiava na suposição dessas leis, senão somente na analogia da planta. Entendida essa idéia, aplicando-a universalmente, logo ficará claro que, na filosofia verdadeira, cada ação física tem seu efeito moral e eterno. Prejudique a um homem, causando-lhe um dano corporal; pensará que sua pena e sofrimento não podem de nenhum modo afetar a seus próximos, e muito menos a homens de outras nações. Nós afirmamos que isto acontecerá no seu devido tempo. Enquanto cada homem não compreender e aceitar — como uma verdade axiomática — que prejudicando a outro nos prejudicamos, não só a nós mesmos como a toda humanidade, não são possíveis na Terra sentimentos fraternais, tal como pregaram todos os grandes pensadores, principalmente Buddha e Jesus.



[1] Publicanos:  considerados  naqueles tempos como ladrões e larápios. Tanto o nome como a profissão de publicano eram para os judeus as coisas mais odiosas do mundo. Não se lhes permitia entrar no templo, e Mateus (XVIII, 17) fala de um pagão e de um publicano, como sinônimos. Sem dúvida eram apenas os arrecadadores de impostos romanos,e ocupavam a mesma posição que os empregados oficiais ingleses ocupam hoje em dia na índia e outros países ocupados

[2] "No fim da Idade Média, a escravidão dominada por forças morais havia desaparecido da Europa; mas aconteceram dois episódios importantes que anularam o poder moral que trabalhava na sociedade européia, e deram margem a uma série de calamidades que quase se pode dizer  que jamais  se  conheceram  outras  maiores.   Um  desses  acontecimentos foi a primeira viagem à costa populosa e bárbara onde os seres humanos eram artigo usual  de tráfico;  e  o outro, o descobrimento do Novo Mundo, onde se abriram mananciais de riqueza, para cuja exportação  só  faltava   levar braços  que  trabalhassem.   Durante  quatrocentos anos,   homens,   mulheres  e  crianças  foram  separados de  todos  os   que amavam e conheciam, para serem vendidos como escravos; acorrentados nos porões dos navios (muitas vezes juntos — os mortos e os vivos — em terríveis travessias); e conforme Bancroff — historiador imparcial — de mais de três milhões de seres, 250 mil foram jogados à água nesta época, enquanto o resto era condenado a inenarrável miséria e sofrimento cruel nas minas, ou a gemer sob o chicote nos canaviais e arrozais. A culpabilidade deste grande crime recai sobre a Igreja cristã. O governo espanhol firmou mais de dez tratados autorizando a venda de quinhentos mil seres humanos, "em nome da Santíssima Trindade". Em 1562, sir John Hawkins se pôs ao mar para empreender a infernal viagem que tinha por objetivo comprar escravos na África para vendê-los nas índias Ocidentais, em um navio que tinha o nome sagrado de Jesus; e Isabel, a rainha protestante, recompensou-o por seu êxito nesta primeira aventura dos ingleses naquele desumano tráfico, autorizando-o a usar como escudo de armas "um meio mouro em sua cor natural, preso com uma corda", isto é, um escravo negro acorrentado" (Conquistas da Cruz - tirado do Agnostic Journal).

 

 

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